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Ação Macropolítica

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Plano de Bairro mobiliza moradores a criar propostas de planejamento urbano
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Fundação Tide Setubal, Fundação Getulio Vargas e organizações locais do Jardim Lapenna criaram o primeiro plano participativo para organizar demandas da região

Em 2017, o Jardim Lapenna, na zona leste paulistana, começou um importante movimento de mobilização popular para a conquista de demandas locais, com a criação do Plano de Bairro do Jardim Lapenna. A iniciativa dialoga com a nova forma de trabalhar no território adotada pela Fundação, em que o atendimento direto dá lugar à atuação conjunta com organizações e instituições locais, buscando o seu fortalecimento.

Esse trabalho em conjunto com organizações locais e o poder público já vinha sendo feito pela Fundação Tide Setubal no Jardim Lapenna, e a mobilização de diferentes atores, sobretudo com o Fórum de Moradores animado pela Fundação, rendeu importantes conquistas. São exemplos uma nova Unidade Básica de Saúde com atendimento do Programa Saúde da Família, a construção da CEI Jardim Lapenna e da CEMEI Jardim Lapenna I, um Centro da Criança e do Adolescente, o acesso à estação São Miguel, além do coletor tronco, que atendeu parte significativa do território e foi fundamental para o saneamento básico da região.

“A mobilização da comunidade que vive no Jardim Lapenna não é de hoje. Conquistas importantes foram alcançadas ao longo dos últimos dez anos. E, mais recentemente, houve um processo de reflexão que abordou o tema: O que você sonha para o seu bairro? Foram realizados encontros e elaborado um mapeamento simbólico com base nos desejos de mudança com a participação, por meio de estratégia político-pedagógica, de instituições e moradores. Essa reflexão indica um caminho importante para o planejamento do bairro, que necessita dar passos para atender às demandas infraestruturais e tem se tornado ainda mais necessário desde 2013, quando houve um salto populacional na região”, explica José Luiz Adeve, coordenador do círculo territórios da Fundação Tide Setubal.

Em 2016, membros da comunidade do Jardim Lapenna, com participação da Fundação Tide Setubal e das agentes de saúde do Programa Saúde da Família (PSF), continuaram esse processo de busca por melhorias e decidiu-se que o melhor caminho para obter novas vitórias junto ao poder público e atender às demandas locais seria a criação do Plano de Bairro, um instrumento que tem como base a participação da população no planejamento da cidade e está previsto no Plano Diretor do Município de São Paulo.

O objetivo de elaborar o Plano de Bairro é incentivar o cidadão a pensar a cidade e a mostrar que, por meio de uma gestão participativa e democrática, pode-se conseguir um desenvolvimento urbano sustentável da região. O instrumento pode propor decisões para as áreas de iluminação, segurança, resíduos sólidos, pavimentação, ciclovia, pontos de ônibus, microdrenagem, entre outros elementos de infraestrutura.

O Plano de Bairro do Jardim Lapenna foi estruturado em três etapas. A primeira delas foi o diagnóstico externo, realizado no começo do ano pela Fundação Getulio Vargas, com base em dados encontrados sobre o território e sobre a população estatisticamente. Após essa etapa, que contou com o apoio dos agentes de saúde do Programa Saúde da Família e do Programa Ambientes Verdes e Saudáveis (PAVs) para sua elaboração e execução, moradores e representantes de instituições locais organizaram-se em forma de um colegiado, que tem funções essenciais em todas as etapas da iniciativa.

Composto no mês de maio, o Colegiado do Plano de Bairro conta com a Associação Comunitária das Mulheres da Vila Nair, Creche Jardim Lapenna 1, Creche Jardim Lapenna, CCA Procedu Jardim Lapenna, EE Professor Pedro Moreira Matos, Fundação Getulio Vargas, Fundação Tide Setubal, Programa Ambientes Verdes e Saudáveis, Sociedade Amigos do Jardim Lapenna, SOS Lapenna, Conselho Gestor e PSF da UBS Jardim Lapenna e o apoio da Prefeitura Regional de São Miguel Paulista.

“Cada organização tem sua agenda e suas prioridades, então tivemos que lidar com essas questões dentro do colegiado, achando pontos em comum, e também dialogar com lideranças históricas no território e suas conexões com outros grupos de interesse”, diz José Luiz.

Após a consolidação do colegiado, o grupo realizou uma reunião com o prefeito Regional de São Miguel Paulista, Edson Marques Pereira, na qual a metodologia e os objetivos do Plano de Bairro do Jardim Lapenna foram explicados. Ao término do encontro, Marques declarou seu apoio à iniciativa e demonstrou empolgação com o projeto. “O Plano contribui muito para o trabalho da Prefeitura Regional, pois reúne as demandas de toda a comunidade do Lapenna, suas lideranças e também de profissionais que atuam na área.”

Na segunda etapa do Plano de Bairro Participativo do Lapenna, foi realizado um diagnóstico interno, a partir do qual os próprios moradores vivenciam e imaginam. Essa fase começou no dia 10 de junho, no lançamento da iniciativa, que contou com diversas atividades para que as pessoas pensassem no que gostariam de melhorar na região.

Algumas organizações locais participaram do evento. As equipes da UBS e do Programa Saúde da Família realizaram o recolhimento de óleo de cozinha usado e animaram a barraca com brincadeiras para crianças. Já os meninos e meninas que frequentam o Centro para Crianças e Adolescentes (CCA) Lapenna apresentaram uma radionovela sobre o Plano de Bairro, entrevistaram especialistas e conduziram um bate-papo com a participação de lideranças locais e membros do colegiado.

Após o lançamento, foram feitas três oficinas com a comunidade, cada uma em um local do bairro. “O desafio era juntar o maior número de pessoas possível. No início, vimos que alguns grupos da população se envolviam pouco, como as mães de crianças. Aos poucos, encontramos soluções simples para elevar a participação, como separar um local com atividades para as crianças enquanto as mães integravam as reuniões”, diz Ciro Biderman, professor e pesquisador da FGV-EAESP.

Praça dos sonhos

Além das oficinas, algumas intervenções urbanas de pequeno porte, batizadas de acupuntura, auxiliaram a população a entender do que se tratava o Plano. A maior delas aconteceu em agosto e envolveu moradores, membros do colegiado e cerca de 100 funcionários do Hospital Infantil Sabará e do Instituto Pensi na reforma de duas praças da região. “Temos um programa de formação de voluntariado para a área da saúde, com mais de 100 voluntários dentro do hospital. Mas o programa não é voltado aos nossos funcionários, e eles desejavam fazer atividades nesse sentido”, afirma José Luiz Setúbal, presidente do Conselho da Fundação José Luiz Egydio Setúbal, que engloba o Hospital Infantil Sabará e o Instituto Pensi. A proposta foi tão bem recebida no hospital que, dos 750 funcionários, 150 participaram direta ou indiretamente.

Ver os voluntários atuando na melhoria do espaço público animou os moradores. “Ter a contribuição de pessoas de fora só reforçou o senso de coletivo e demonstrou aos moradores que a união de todos nos traz uma sociedade melhor”, afirma Cleiton da Silva Santos (o Kaki), vice-presidente da Sociedade Amigos do Jardim Lapenna e membro do colegiado.

Outra acupuntura importante ocorreu durante a Virada Sustentável. No evento, foi abordada uma das questões levantadas desde as primeiras reuniões do Plano de Bairro: o acúmulo de lixo, que tanto atrapalha a vida da população local com o mau cheiro e as enchentes. Em colaboração com a ONG SOS Lapenna, que integra o colegiado, foi iniciada a coleta de material reciclável por catadores no bairro. “Além da questão ecológica, com muita gente descartando o lixo de forma errada, pensamos na qualidade de vida dos catadores”, diz Carlos Borel de Carvalho, o Dida, membro do colegiado e criador da ONG.

Para viabilizar a ação, a SOS Lapenna, agentes do PAVS e agentes comunitárias de saúde da UBS Jardim Lapenna procuraram a Cooperativa Guerreiros de Deus, com o plano de incentivar a coleta seletiva por catadores que já moram no Lapenna, mas não têm o hábito de recolher materiais no bairro. “A ideia principal é melhorar a questão dos resíduos dentro do território. Fiz um levantamento, visitei os catadores, apliquei os questionários e entendi onde eles vendem e como eles trabalham. Queremos mostrar que eles podem ser mais valorizados dentro do território”, diz a agente do PAVS Caroline Joana.

Propostas aprovadas

No fim de outubro, chegou o momento de a população validar as propostas coletadas no diagnóstico. Mais de 50 moradores do Jardim Lapenna participaram da última etapa pré-finalização do documento. A edição final das propostas já validadas foi realizada pela FGV no fim do ano.

Paralelamente, o colegiado começou a integrar atividades na Câmara dos Vereadores com o intuito de incluir o Plano de Bairro no Plano Plurianual da cidade. No dia 15 de dezembro de 2017, o Plano de Bairro do Jardim Lapenna deu mais um passo rumo à sua implementação. Na ocasião, a proposta e metodologia foram apresentadas para o Conselho Municipal de Política Urbana (CMPU) de São Paulo, durante a 47ª Reunião Ordinária do grupo, que contou com a presença da secretária de Urbanismo e Licenciamento, Heloisa M. Salles Penteado Proença. A etapa marcou a oficialização do Plano de Bairro do Jardim Lapenna, e o seu primeiro ano de atuação. Em 2018, a iniciativa segue em atividade, agora para viabilizar a implementação das propostas criadas pela comunidade.

Confira a linha do tempo do Plano de Bairro: